terça-feira, 10 de junho de 2025

A trilha sonora de Ainda Estou Aqui

Uma celebração à arte, à memória e à música

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25

Que alegria ver o país inteiro festejando uma atriz brasileira levando um prêmio tão importante como o Globo de Ouro!

É, eu sei que ela pediu pra que ninguém ficasse em clima de Copa do Mundo, mas pra mim Fernanda Torres é o meu “ídolo nacional nos esportes”! Mesmo porque o meu sedentarismo me impede de ter qualquer familiaridade com o mundo esportivo — o meu negócio é ficar no sofá vendo filme ou ouvindo música...

Falando nisso, e a trilha sonora de Ainda Estou Aqui, que também é to-tal-men-te maravilhosa?

A trilha do filme foi cuidadosamente tecida por Warren Ellis, músico e compositor australiano, conhecido pelos seus trabalhos com Nick Cave e também por ter participado de outras trilhas famosas, como as de Django, Back to Black e Blonde.

Eunice Paiva (Fernanda Torres) e Rubens Paiva (Selton Mello) dançando
portalmud.com

Ainda Estou Aqui é uma experiência sensorial, como na cena em que a personagem Veroca manda uma carta de Londres para os pais e... calma, não vou dar spoiler pra quem não viu o filme. Mas é impossível falar da trilha sem revelar o roteiro, porque cada música faz um papel importante para contar a história: das músicas que embalam os momentos felizes em família, àquelas que resumem os anos de escuridão na ditadura, as que surgem na época da anistia e também as que falam de saudade.

Essa semana, muita gente voltou a falar da trilha do filme pela coincidência da música A Festa do Santo Reis, do Tim Maia, fazer parte da trilha — e o fato de que o Brasil ficou em festa, na madrugada do dia 6 de janeiro (Dia de Reis), quando Fernanda Torres levou seu Globo de Ouro de Melhor Atriz Dramática por sua interpretação de Eunice Paiva em Ainda Estou Aqui.

Quer outra coincidência de datas da trilha? A música É Preciso Dar um Jeito, Meu Amigo, de Erasmo Carlos, voltou às paradas musicais do país no dia 22 de novembro de 2024 — data exata dos dois anos da morte do cantor. A música viralizou por causa do filme e foi parar no Top 50 virais do Spotify Brasil. 

Cena da volta de Veroca ao Brasil
clubedecinema.pt


É Preciso Dar um Jeito, Meu Amigo, que traz versos críticos à ditadura, é uma composição de Erasmo Carlos com Roberto Carlos, que muitos associam como simpatizante do regime na época. Algumas biografias do Rei desmentem essa crença, outras apoiam, mas todas concordam com o fato de que Roberto Carlos foi visitar Caetano Veloso em seu exílio em Londres durante a ditadura, e escreveu para o cantor Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos.

Caetano Veloso gostou do presente e retribuiu com Como Dois e Dois, que também faz parte da trilha de Ainda Estou Aqui. Ah, e como dois e dois, tanto Caetano quanto Roberto Carlos aparecem duas vezes na trilha sonora do filme.

E nem só músicas nacionais compõem a trilha de Ainda Estou Aqui. O filme tem a francesa Je t’aime... moi non plus, de Serge Gainsbourg e Jane Birkin, que basicamente narra um ato sexual e que, na época da ditadura, foi proibida no Brasil pelo coronel Aloisio Mulethaler, chefe do Serviço de Censura e Diversões Públicas do Departamento de Polícia Federal, que mandou apreender todas as cópias da canção nas lojas de discos.

Tem também a linda Petit Pays, da cantora cabo-verdiana Cesária Évora, que fala sobre saudade e aparece num momento delicado do filme, quando a família resolve justamente falar sobre... tá, vou parar de falar da trilha antes que eu solte um spoiler!

A trilha sonora não foi lançada oficialmente, mas eu deixei aqui abaixo a listinha com as músicas pra vocês irem ouvindo. E quem não assistiu Ainda Estou Aqui, aproveite esse fim de semana!


Músicas da Trilha de 'Ainda Estou Aqui'

Cena do filme "Ainda Estou Aqui"
threads.com/aindaestouaqui
“A Festa do Santo Reis” – Tim Maia
“Jimmy, Renda-Se” – Tom Zé
“É Preciso Dar Um Jeito, Meu Amigo” – Erasmo Carlos
“Acauã” – Gal Costa
“Je T’aime Moi Non Plus” – Serge Gainsbourg & Jane Birkin
“Alexander” – Philip May, Alan Walker, Richard Taylor Clifford, John Povey
“Take Me Back to Piauí” – Juca Chaves
“Baby” – Os Mutantes
“Agoniza, Mas Não Morre” – Nelson Sargento
“As Curvas da Estrada de Santos” – Roberto Carlos
“Como Dois e Dois” – Roberto Carlos
“The Ghetto” – Donny Hathaway
“The Fight” – Johann Johannsson
“Fora da Ordem” – Caetano Veloso
“Petit Pays” – Cesária Évora
“Um Índio” – Caetano Veloso
“Falsa Baiana” – Gal Costa

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Entre cenas e canções: o ritmo do cinema nacional

Músicas marcantes do cinema nacional

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25

O casamento entre música e cinema deu certo no Brasil e rendeu aos espectadores muitas obras icônicas para guardar no coração e na memória.

Gabriela, Cravo e Canela 
vitaminanerd.com

Gabriela, Cravo e Canela

Poucas trilhas sonoras nacionais marcaram tanto quanto a seleção musical do filme Gabriela, Cravo e Canela, de 1983. O longa é uma adaptação da obra homônima de Jorge Amado e fez sucesso no mundo inteiro com a atuação de Sônia Braga no papel principal. A música-tema do filme, Modinha Para Gabriela, se tornou um dos maiores sucessos na voz de Gal Costa.

Cazuza - O Tempo Não Para
columbiapictures.com

Cazuza – O Tempo Não Para

A vida e a obra do cantor e compositor Cazuza são o tema do filme Cazuza – O Tempo Não Para (Sandra Werneck e Walter Carvalho, 2004). Como não poderia deixar de ser, a trilha sonora do longa é recheada de músicas do cantor que dá nome à cinebiografia, como Codinome Beija-Flor, um dos hits mais românticos da carreira de Cazuza.


Xica Da Silva
oglobo.com

Xica da Silva

O filme Xica da Silva (Cacá Diegues) conta a história de uma escrava que conquistou um representante da Coroa Portuguesa e se tornou a rainha do diamante nas Minas Gerais do século XVIII. A trilha sonora do longa inclui Xica da Silva e outras músicas de Jorge Ben Jor e Roberto Menescal.


Capitão Nascimento - Tropa de Elite
gazeta.com.br
Tropa de Elite

O filme Tropa de Elite (José Padilha, 2007), que mostra os desafios do capitão Nascimento (Wagner Moura) à frente de uma operação de pacificação do Morro do Turano, está listado até hoje entre as maiores bilheteiras do cinema brasileiro. A seleção musical que embala o sucesso de ação inclui a faixa Tropa de Elite, da banda Tihuana, e sucessos de Cidinho e Doca, MC Júnior e MC Leonardo, Titãs, Pedro Bromfman e outros nomes da música nacional.

Xuxa e Sergio Malandro - Lua de Cristal
gdxuxa.weebly.com
Lua de Cristal
Baixinhos de todas as idades se emocionaram com Lua de Cristal (Tizuka Yamasaki, 1990), estrelado por Xuxa Meneghel, que narra a história de Maria da Graça, uma jovem simples que se muda para a cidade grande e luta para realizar seu sonho de cantar. O filme inspirou a música-tema Lua de Cristal.


Hits do cinema nacional

 As músicas mais amadas das telonas brasileiras

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25
Cantores brasileiros
ims.com.br

As trilhas sonoras de filmes brasileiros são verdadeiras obras de arte que, muitas vezes, transcendem o próprio cinema. Elas são capazes de emocionar, animar e até chocar os espectadores que se entregam aos clássicos da sétima arte nacional.

Com frequência, essas composições ganham vida nas vozes e instrumentos de artistas consagrados da música brasileira, como Gal Costa, Gilberto Gil, Cazuza, Caetano Veloso, entre tantos outros nomes que marcaram gerações. Mais do que simples acompanhamentos musicais, essas faixas se transformam em elementos essenciais da narrativa, contribuindo para a construção de atmosferas, intensificando sentimentos e, em muitos casos, se tornando tão memoráveis quanto os próprios filmes.

Muito além das telonas, elas ultrapassam os limites das salas de cinema, conquistando espaço nas rádios, nas trilhas pessoais do público e no coração de milhões de brasileiros. Tornam-se trilhas sonoras da própria vida de quem as ouve, acompanhando momentos e evocando memórias.

É difícil imaginar o romance cômico Lisbela e o Prisioneiro sem a delicada interpretação de Caetano Veloso em “Você Não Me Ensinou a Te Esquecer”, canção que se funde perfeitamente com o tom melancólico e apaixonado da história. Da mesma forma, as cenas intensas de Tropa de Elite perderiam parte de sua força sem a energia explosiva da música “Tropa de Elite”, da banda Tihuana, que virou quase um hino de uma geração impactada pela dureza do filme.

Outros exemplos também mostram como a música pode ser parte fundamental da experiência cinematográfica. Em Cidade de Deus, a trilha mistura samba, funk e música eletrônica para retratar o cotidiano das favelas cariocas com autenticidade e intensidade. Já em Central do Brasil, a trilha de Antonio Pinto oferece um toque de sensibilidade e emoção que eleva ainda mais a comovente jornada dos personagens.

No fim das contas, as melhores trilhas sonoras de filmes são aquelas que conseguem ir além da função estética: elas agregam emoção, ampliam o impacto dramatúrgico da obra e criam uma ligação profunda com o público. Funcionam como um elo invisível entre roteiro, atuação e direção, enriquecendo a experiência audiovisual inesquecível.

O que a música e o cinema têm em comum

 A interseção entre música e cinema

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25

Quando falamos de cinema é importante relembrar o termo audiovisual. A junção entre imagem e som produz a cena. Sem som, não há cena, e isso vale inclusive no período do cinema “mudo”. As célebres aparições de Charles Chaplin nas grandes telas vinham sempre acompanhadas de uma brilhante trilha sonora, que, na ausência de texto verbal, cumpria bem o papel de promover entendimento aos telespectadores.

Nesse contexto, a música desde sempre tem sido uma ferramenta essencial na construção das cenas. Quando um diretor inicia a idealização da obra, geralmente precisa pensar bem na escolha do compositor de suas trilhas. Basicamente, não há filme bom com trilha ruim. 

Filme 007 - SkyFall
tudosobrefilme.com.br
É importante frisar que existem diferenças entre trilha sonora e trilha musical. A trilha musical é o conjunto de canções que embalam a história do filme. Algumas são compostas especialmente para o filme, como o caso de Bicho de Sete Cabeças, de André Abujamra, composta especialmente para o longa brasileiro de mesmo nome. Também há Skyfall, da britânica Adele, que foi composta para a trilha de 007 – Operação Skyfall e premiada com o Oscar de Melhor Canção Original em 2013.

A trilha sonora é o conjunto de todos os sons presentes no filme, sejam canções, sons instrumentais, ruídos da natureza, dentre outros. O trabalho de englobar todos os sons e deixá-los harmônicos e complementando — ou até conversando — com as cenas é árduo e extremamente essencial para garantir um bom resultado.

Cena do filme "RIO"
hollywoodstreams
Na animação Rio (2011), Carlinhos Brown é um dos produtores que assinam a trilha sonora, que engloba canções e outros sons que marcaram o sucesso do filme. A canção “Real in Rio”, principal do álbum do filme, foi indicada como Melhor Canção Original no Oscar em 2012, mas infelizmente não levou a estatueta.

E como falar de música e cinema sem falar dos musicais? Basicamente, o gênero consiste no estilo de obra que se apoia em músicas, coreografias e canções, que por si só conduzem a história do início ao fim. Um dos mais célebres musicais do cinema mundial é O Rei e Eu (1957), premiado em grandes festivais — inclusive no Oscar. A obra é uma primazia de união entre a imagem e o som, que assume um protagonismo que agrega emoção e identidade à história.





Do palco à contracultura

 A trajetória dos musicais entre aplausos e revoluções

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25

In the Heights
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Nesse momento são lançados musicais de peças que já faziam sucesso como O Rei e Eu (The King and I, 1956) e Em Busca de um Sonho (Gypsy, 1962), um hábito que dura até os dias de hoje: por exemplo, o filme Em um Bairro de Nova York (In the Heights), que estava com a estreia prevista para esse ano. 


Desse intercâmbio nasce A Noviça Rebelde (The Sound of Music, 1965), Amor, Sublime Amor (West Side Story, 1961) e Oliver! (1968), todos vencedores do Oscar de melhor filme, sendo Oliver! o último musical a receber esse prêmio no século 20.

No fim da década e durante boa parte da seguinte, o gênero sofre um forte declínio, mas ainda longe de morrer. Poucas produções marcantes são lançadas, mas é nesse momento, por exemplo, que Bob Fosse dirige Cabaret (1972), trazendo mais dinâmica do que os filmes anteriores, se utilizando de vários cortes ao invés de manter a câmera estática como se estivesse assistindo a uma peça.

Hair, o musical
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Nesse momento, também começam a aflorar obras mais experimentais, críticas e de contracultura: o movimento hippie contra a Guerra do Vietnã inspira Hair em 1979 e temas sobre sexualidade e liberdade sexual surgem no trash The Rocky Horror Picture Show de 1975, que possui o recorde de filme que passou o maior tempo em cartaz, sendo exibido diariamente por décadas na sessão da meia-noite de cinemas alternativos de Nova Iorque. 

Isso foi ampliando as possibilidades sobre os assuntos que um musical poderia tratar e sobre como fazê-lo. Atualmente, já carregamos toda essa história cinematográfica e isso é palpável quando percebemos a variedade dos musicais mais recentes.

Por mais que pareça que, nostalgicamente, os musicais eram absolutos como sucesso, é impossível agradar todos. Sempre existirá um público que recusa esse estilo de filme, seja por ser muito fantasioso ou por não se agradar com as histórias.

Não é difícil encontrar pessoas que se incomodam com as músicas repentinas, as coreografias e que sentem que isso quebra a cadência da obra. O jornalista e cineasta Duda Leite disse: “Acredito que são pessoas que não apreciam filmes não realistas, onde a fantasia é o principal aspecto (...) Mas também acredito que existe uma dose de preconceito um pouco descabido, já que os filmes musicais podem ser tão variados”.

Existe uma noção de que as histórias são sempre rasas e com desculpas para números musicais, o que não se aplica.

É um gênero que pode ser chocante para quem nunca viu, especialmente nas primeiras músicas até entender como elas funcionam naquele universo. Um grande problema é que as canções contam a história tanto quanto as falas e, por isso, esse estilo exige um trabalho mais complexo para os tradutores.

É essencial que o espectador compreenda o que está sendo dito para poder acompanhar o filme, seja dublando as músicas ou legendando-nas, mas essa parte não pode ser negligenciada, porque é fácil se deixar levar pela melodia e perder as informações que estão sendo passadas. 

Melodias em cena: a arte dos musicais no mundo do cinema

 O princípio, como bem disse a Noviça Rebelde

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25

Cena da música “Dó, Ré, Mi” de “A Noviça Rebelde”
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“E então começar do princípio, é sempre o melhor lugar”, disse um dia a noviça rebelde. Para entender o que é e o que representa um filme musical, o melhor ponto de partida é o início. Enquanto o teatro musical vem desde os princípios da arte ocidental, o cinema musical dependia de um fator importante para existir: o som. Assim, quando surge o filme sonoro com O Cantor de Jazz (The Jazz Singer, 1927), surge também o filme musical. Essa é a primeira obra sonora e o primeiro musical produzido no cinema e, desde então, ambos foram se popularizando: o som soberano e o musical se adaptando como o gênero que é.

Já em 1930, na segunda edição da premiação do Oscar, o vencedor da categoria de “melhor filme” era um musical: Melodia da Broadway (Broadway Melody, 1929). Nesse momento, os Estados Unidos passavam por uma severa crise econômica que levou à “grande depressão” durante a década seguinte, e filmes como O Picolino (Top Hat, 1935) e Vamos Dançar? (Shall We Dance?, 1937), estrelando Fred Astaire e Ginger Rogers, serviam como um belo entretenimento para um público que estava carente dele.

É nesse momento que a Disney lança Branca de Neve e os Sete Anões (Snow White and the Seven Dwarfs, 1937), fazendo história com o primeiro longa animado e que foi um sucesso, com produtos relacionados a ele sendo vendidos até hoje.

Sobre entretenimento para gerar esperança no povo, talvez o maior exemplo seja O Mágico de Oz (The Wizard of Oz, 1939). A aventura de Dorothy pela estrada de tijolos amarelos é atemporal e admirada até hoje. Como esquecer o “somewhere over the rainbow” da Dorothy? O longa é considerado um dos dez melhores filmes dos últimos 100 anos pelo American Film Institute.

No mesmo ano inicia-se a Segunda Guerra Mundial, que conta com a participação dos EUA, e Hollywood passa a produzir filmes incitando o nacionalismo e manejando sua política de boa vizinhança, o que se estende além do fim da guerra.

É o início da “era de ouro” dos musicais. Filmes como Cantando na Chuva (Singin’ in the Rain, 1952) e os sucessos da Marilyn Monroe, como Os Homens Preferem as Loiras (Gentlemen Prefer Blondes, 1953), são dessa época.

“Quando a guerra acaba, a política de boa vizinhança se intensifica. Filmes com artistas estrangeiros ficam mais comuns. Os filmes de Carmen Miranda eram um sucesso, mas o Brasil já estava no bolso”, diz Gerson Steves, ator, jornalista, diretor e autor do livro A Broadway não é aqui: panorama do teatro musical no Brasil, entrevistado pela Jornalismo Júnior para auxiliar na construção da matéria. “Era preciso conquistar novos mercados. Note a importância de An American In Paris (com Gene Kelly, 1951) e Gigi (1958) – ambos com a starlet Leslie Caron”.

Contudo, a situação nos Estados Unidos começa a normalizar no fim dos anos 1950 e a demanda por esse tipo de entretenimento começa a cair. É quando a indústria começa a olhar para o teatro musical, mais especificamente para a Broadway, buscando se reinventar para agradar o novo público que surge.

Músicas marcam primeiros anos da sétima arte

Elas têm papel fundamental na evolução do cinema em suas primeiras décadas

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25


De início, a aplicação da música nos filmes ficava restrita às trilhas musicais, posteriormente dando lugar para a mistura com as vozes. Elas eram tratadas com a mesma estética. Quando não havia diálogo, a música preenchia o buraco. A apreciação alternativa de uma cena, guiada pelo áudio, não existia um século atrás, quando Thomas Edison decidiu sincronizar a exibição de imagens ao áudio de um fonógrafo. Na época, parte dos espectadores argumentavam que a voz pudesse nem sempre ser o foco da narrativa, já que isso poderia acarretar em uma “teatralização” do filme. Por que ir ao cinema se eles podiam ter uma experiência equivalente, com pessoas reais, no teatro?

Cena da coreografia de "The Broadway Melody"
miro.medium
Em meio a isso, há o nascimento do cinema com música, que levaria a filmes como O Nascimento de uma Nação, drama americano da Guerra Civil, até The Broadway Melody de 1929, o primeiro grande musical falado.

Entre os anos 1930 e 1960, Hollywood viu o crescimento dos musicais, período que é tratado como a Era de Ouro. À época, Carmen Miranda, Frank Sinatra, Fred Astaire e Judy Garland estavam no auge de suas carreiras nas telonas. Dan Golding conta que os “gêneros musicais do cinema” foram formados, em paralelo aos filmes musicais, nesse mesmo período. A origem dos clichês de terror, por exemplo, pode ser notada em A Noiva de Frankenstein, de 1935. Em meados dos anos 1960, tivemos mais exemplos criativos. 007 Contra o Satânico Dr. No, o primeiro de James Bond, utilizou a canção do grupo The John Barry Seven – nossa referência atual para filmes de espião.

Na época, os filmes western (velho-oeste) também evocavam o espírito aventureiro. A Conquista do Oeste é um primeiro grande exemplo, mas você provavelmente vai se lembrar mais do tema de Três Homens em Conflito, que veio quatro anos depois.

Trilhas sonoras se tornam ferramentas de impacto emocional no cinema

Como a música se tornou essencial na linguagem do cinema

Ellen Abreu,
Maria Clara Neder e
Maria Luísa F. Valle C. Gonçalves.
Fonte: gshow.globo.com
Em: 10/01/25

Cartaz dos musicais “A Noviça Rebelde’ e ‘Cantando na Chuva”
adorocinema.com

Aquilo que você escuta em frente às telonas também está carregado de sentido. Dos musicais da década de 1930 aos blockbusters da Marvel, entenda como trilhas podem mexer com quem assiste.

Trilha sonoras são nada além do que a aplicação da música e dos sons na construção de uma história, independente de ser no cinema, teatro ou TV. No primeiro caso, temos o áudio como parte ainda mais essencial da experiência. Afinal, pouco adianta ter uma tela gigante sem um som parrudo, certo?

A tecnologia mudou constantemente no século dos filmes projetados, é verdade. Mas a filosofia quase sempre foi a mesma: o áudio casa com a imagem e serve para te transportar para dentro daquela cena, seja em um roteiro de comédia, ação, aventura, terror ou um musical.

Em entrevista ao Bitniks, Dan Golding, compositor e professor da Universidade de Tecnologia de Swinburne, na Austrália, diz que música e a imagem são experiências complementares. “A música geralmente não acrescenta nada que não seja contado pela imagem. Mas ainda é importante por moldar o significado das coisas ao público”.

Ele compara dois tipos de música em um mesmo cenário. Primeiro, basta imaginarmos a cena de uma praia repleta de turistas. Se colocarmos a trilha de um violão tocando, a cena pode ter um tom relaxante e divertido. Do contrário, ao colocar o tema do filme Tubarão, a cena muda completamente. “Ambas as possibilidades estão na imagem (terror e tranquilidade), mas é a música que dita ‘o que’ você está olhando”, conta.

“O básico da música é a experiência musical. Seja como espectador de filme, seja na dança, a música sempre vai afetar a gente”, opina Graziela Bortz, professora de análise, teoria e percepção musical da Unesp (Universidade Estadual Paulista). “Independentemente da minha formação [enquanto indivíduo], há filmes que me pegam pela emoção, pois a música intensifica algumas cenas”. Em nossa conversa, a especialista explica a ótica de um musicista sobre o áudio do cinema. Porém, antes, é necessário voltarmos à raiz da sétima arte.